quarta-feira, 31 de julho de 2013

Versos para não serem lidos

Por favor leia outros versos.
Os meus não são para os sãos.
Os meus versos são para os doentes,
Seres brilhantes,
o lugar de vocês não é junto a mim.

Por favor leia outros versos.
Os meus são de desilusões
os meus são de desamor.
Aqui não há nenhum verso
que possas recortar
e por num buquê de flores para aquela garota.
Minha poesia não conquista ninguém.

Por favor leia outros versos.
Os meus versos são para os desesperados
para os feios e descompensados
para os deslocados
e infidelizados
para os destroçados
pelo amor.
Para os infelizes.
Para os solitários
para os tristes.

Por favor leia outros versos.
Aqui não há aforismos
nem ditados para você repetir
Aqui so há coisas tristes.
Que irão te destruir.

Saia daqui.
Aqui é lugar dos destruídos.

Por favor leia outros versos.
Mas se caso for,
o teu dilema for o desamor.
Fique aqui, vamos conversar.
Eu te farei um café
e você me contará
e eu escreverei outros versos
para não serem lidos.

domingo, 28 de julho de 2013

Esquecimento

E sempre fui dessas que anotam todos os pensamentos
para nunca esquecê-los,
em cadernos que você olha e pensa:
Esta lunática vive às voltas
com um caderno ou outro
e não entende
que estou anotando
registrando,
escrevendo
gerundiando o mundo.
Certo dia
na pressa,
Esqueci o meu caderno.
Acho, não tenho certeza,
mas acho que foi nesse dia
que esqueci você.


Por eles...

Amém.
E digam amém.
E digam que nem
Vão se deixar.
Eu quero ter fé
Nesta mulher.
Eu quero um nome
Uma rima
Quero ter fé neste homem.
E digam amém
E digam também
Vão se amar.
Preciso de uma história
Para contar
De um poema para escrever.
Beijem-se.
Abracem-se.
Preciso viver.
Meu peito é inerte.
Sem vida e infértil.
Mas se me der um tema.
Eu faço um poema.
De amor eterno.
E digam:
Amém.
Na minha poesia
Serão eternos também.

Em homenagem ao passarinho morto na rua

Eu lamento.
lamento muito.
Toquei seu corpinho frio e morto.
E o coloquei no canto da rua.
Deus dos bichinhos.
Que maldade com o passarinho.
Ele poderia viver e viver
Cantar e voar.
E mostrar a todos
o que é liberdade!
Que maldade!
Que maldade!
Morrer logo o passarinho.
Enquanto há muitos como eu
que só se ergue na vida por inércia.
E considera o mundo, 
um mundinho. Um mundinho.
De bom grado
eu daria
minha vida pela do passarinho.
Ele seria muito mais útil do que eu.

Dicionarismos

Deixe que eu te ame em silêncio.
Sem explicações
Sem definições
Sem dicionarismos.
Esse sentimento que você não
Vai encontrar nas páginas de nenhuma
enciclopédia Britânica arcaíca.
Muito menos no Wikipédia.
Deixa eu te amar
Apenas por amar
Por me sentir próximo a você
E ter vontade de te presentear com minha presença.
Porque se em algum momento
eu tiver de me explicar e quebrar meu silêncio
Saiba que o amor acabou.

Porque amor não se explica.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Ele que sabia tudo sobre mim...

Ele sabia tudo de mim
Sabia minha dor e minha angustia
Sabia da tortura e da poesia
Sabia das minhas cicatrizes
e onde encontrar cada uma delas.
Sabia sobre a melancolia
Sabia quando a dor apertava.
Era em sangue que eu vertia
Sabia
Gutural
Sabia do meu bem e meu mal
sabia da paixão intensa
Sabia do prazer,
do disparate.
Sabia e não ria da minha arte
Uma coleção completa
de infelicidade, injustiça e desamor.
Sabia da minha entrega total à solidão.
Ao inferno.
E minha devoção obsessiva pela tristeza.
Sabia que por falta de ser qualquer coisa.
Eu pensei em ser poetisa.
Ele sabia tudo sobre mim.
E tudo do meu amor.
Mas disse-me:
“Pequena não chore assim.
Poetas, poetas não se apaixonam entre si”.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Inquietude

O poeta é na verdade o inquieto.
A inquietude do arquiteto.
do engenheiro
a consciência do médico.
a melancolia do contador
que nunca contará histórias.
O poeta é na verdade
um estado permanente de poesia.
Que chega na janela
no alto do prédio
e olha pessoas.
e vê pessoas cansadas, iludidas, chorosas, sofridas.
Enquanto a
maioria só vê pessoas.
O poeta.
é um grande perdedor
de tempo
de vida
de sonho.
seus próprios.
Porque passa o tempo todo pensando.
E quando nada tem que pensar
recosta-se no espaldar
da cadeira e se pergunta:
Em que pensarei hoje?

Rascunho




Eu preciso me mudar
Ser eu em algum lugar
onde possa me achar.
outra direção,
outro corpo outro aspecto
outra caricatura
outra criatura

Deus.
O rascunho está pronto.
Crie-me novamente.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Devolução


Nada disto é meu.
Nada em absoluto.
Apenas vou colhendo o que é do mundo
e outros autores
o que eles me causam é poesia
será que eu causo poesia em alguém?
É apenas a reação espontânea.
é minha alma vazia
que se preenche de qualquer palavra
a minha mente fértil
que vive em poesia
porque não sabe escrever romances.
Mas nada disto é meu.
É um pouco do Charles, do Drummond, do Pessoa e Saramago.
É um pouco de G. Dias, Castro Alves, Mario Quintana
É um muito de Álvares, do Gabo, Neruda.
É um nada de Cora Coralina.
(e muitos tantos de outros).
Porque se não for inspiração.
É reação.
E nada neste mundo é meu.
Por isso,
devolvo em versos.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Epílogo


Dez anos depois...

A senhora arruma  livros, papéis e fotografias numa estante. Em duas fotografias o mesmo rosto. O dela.  A poeta. Lágrimas disfarçadas descem pelo rosto daquela senhora. A garotinha que se aproxima pergunta:
-Vovó? Está era minha tia? Como ela morreu?
O rosto na fotografia não tinha vivacidade, não tinha brilho, talvez... Quem sabe o que é vida? Talvez as pessoas nasçam com alma, mas nasçam sem vida. Ou seja, sem vivacidade, sem querer, já nasçam afogados na tristeza.
-Ela... sim, era sua tia. Ela morreu quando você ainda era bem pequenininha. Entrou em coma após... após ingerir certa quantidade de um remédio. Ficou quarenta e cinco dias em coma, e depois de muito sofrimento morreu.
-Ela se suicidou vovó?
Como mãe era inconcebível aceitar aquela hipótese. Aquilo havia acontecido  sim, mas não foi repentinamente, a dosagem farmacológica havia sido ministrada durante anos. E culminou quando a poeta fora abandonada em pleno altar...
-Pequenina, há coisas que só o tempo pode explicar.
-E esses livros? Vovó? Algum dia poderei lê-los? Quem é este senhor?
A menina aponta um rosto na capa de um dos livros.
-Este é Charles Bukowski, o autor favorito de sua tia.
-Então será o meu também.

A senhora sorri tristemente, observando o laço pendendo do corpo da menina. O ciclo era interminável.

Morria um poeta. Nascia outro.

Ah... Charles, o amor matou a todos nós.


Veja como tudo começou:

Prólogo
PARTE I
PARTE II
PARTE III
PARTE IV
PARTE V

Meu Caso Com Charles Parte V




Você sabe que o que liga sua alma ao corpo são laços? Bom, podem ser cordas, cetins, o que imaginar, mas há algo que liga seu corpo a alma.
E sabe também que sofrer de amor não é bem sofrer de amor? Eu tenho o dom de converter qualquer dor, qualquer tristeza em dor de amor. Sabe, eu assumo, é mais fácil culpar o amor do que culpar e admitir a loucura, o espírito fraco, a atração inebriante pela tristeza, pela morte. Então tudo isso é culpa do amor. Estou naquele mesmo bar. Do início, sozinha. O mesmo vestido curto, o mesmo salto alto vermelho, e estou desaparecendo. Sabe? Há uma fio imenso, vermelho, que liga minha alma ao meu corpo. Não sei dizer se o que vejo agora é a alma ou o corpo. É tudo muito louco. –Garçom, traga mais uma garrafa de vinho. Esta já é a segunda da noite.
Escrevo freneticamente nos papéis sujos de batom e perfume. Não há companhia. E escrevo essa solidão dominadora.

Ela me tornou isso.
Uma alma em busca do corpo,
Um corpo em busca da alma.
Sem nunca poderem se encontrar
Nem alma e nem corpo,
Porque há entre eles um imenso muro de Berlim”.

Ouço a voz da minha mãe frenética dentro da minha cabeça.

-Faça alguma coisa, faça alguma coisa. Ela pede em rogos desesperados.
Eu ignoro. Não sei o que está acontecendo. Eu penso em Charles e em seu abandono. Se todos são substituíveis, porque não consigo substituí-lo?
Vem o garçom.
-Sua garrafa senhora. –Deseja que eu sirva?
Será que me beijaria de volta se eu o beijasse?! Beijo-o.  Beijo frio, impessoal, amargo.
-Perdão. Peço.
Nada me basta.
Sinto dor. Mas minha poesia é regada a dor. O drama. Drama. Empurro a mesa e a garrafa de vinho se espatifa no chão, os copos, os papeis, o resto de mim, em pedacinhos pelo chão afogados no vinho, espetados nos cacos de vidro. Choro, suplico, suspiro.  Queria que ele voltasse para mim. Alguém que  de verdade nunca foi meu.

Sinto o laço puxado, no meu abdômen resta a parte rasgada, rompida do laço que ligava meu corpo à minha alma.

E ouço o último lamento de minha mãe dentro da minha cabeça.

“Pronto filha, acabou”.

Agora vejo Charles. Ele segura minha mão como se a todo momento estivesse estado ali, e novamente me cobre com seu casaco.
-Charles, eu te amei tanto... eu o amei tanto...
-Eu sei Baby...
Ele me ajuda a levantar, e retira meus sapatos.
-Eu disse baby, isto não é para você.
- Acabou Charles? Acabou?
-Não baby. Tudo está só começando.

Dele também pende aquela parte rompida do laço. Agora somos apenas almas. INSUBSTITUÍVEIS.

Meu Caso Com Charles Parte IV




Eu vou guardar o silêncio. O silêncio é entendimento, mesmo que eu não entenda.Mas o silêncio da voz disfarça o grito do meu coração. O Eclipse de uma mente completamente saturada. Havia me perdido completamente. A vida. A rotina. O amor e as tarifas bancárias eram as coisas que mais me extorquíam energia, e eu fui desanimando de viver. Meu primeiro amor havia partido com meu coração, e eu vivia com Charles, alguns amigos, e um coração postiço, feito de palavras desenhadas num papel. Os batimentos eram medidos numa máquina, de longe se ouvia um bip, bip, bip.

-Como podemos viver de poemas, querida?
-Eu não vivo de poemas Charles. Talvez eles vivam de mim. Eles são meus inquilinos.
-Seu coração depende de palavras.
-A sua existência também.
-Impossível ganhar de você.

Pensávamos. Pensamos que era impossível. Mas vencer é necessário. Alguém vence. Sempre vence, e eu fui vencida, sim. Pelo ciúme. Pela nostalgia. Pela recusa e não aceitação. Eu sabia que aquele sentir não correspondido não me faria tão bem assim... Os versos de amor não correspondido são bonitos... Mas com o tempo se convertem em sangue, em dor, em dias nublados e por último numa tristeza e solidão profunda, que nem mesmo pode ser clinicada. Desta vez sem paracetamol.

Mas ao fim a gente compreende. Pessoas como eu por ai há milhares, porém que não se admitem, morreram dentro das próprias roupas e continuam sorrindo como se nada houvesse acontecido.  Eu havia admitido.
-Você me surpreende pela incoerência. Soprando a própria vela da vida, quando podia muito bem acendê-la.
Deitei-me.  – a voz e o choro de minha mãe atormentava-me a mente havia dias. Eu olhava para todos os lados e ela não estava lá.
“Pobrezinha”. –Eu ouvia. Vozes carregadas de arrependimento dentro da minha mente.

-Charles. Todos nós seremos substituídos?! Então pense que somos peças de um tabuleiro qualquer. Dama, Xadrez. Peças de um jogo que o jogador sempre repõe quando estão quebradas. Há algo que nos diferencia de outras peças?! Somos só isso. Peças.
-Não, não somos, se não todos serviríamos para a mesma coisa. E isso não é possível. Porque às vezes amamos alguém e odiamos outros.
-Ou amamos e odiamos a mesma pessoa. Sim são só peças. Substituíveis.
-Nada há que possa substituí-la. Tem essa particularidade ácida que é só sua.
-E tu tens um amor que é só meu. Eu te amo Charles. E tenho certeza que isso ainda vai me matar.





As dores no meu peito e as vozes no meu cérebro se tornaram mais perspicazes.  Eu não podia imaginar o que era, nem podia entender claramente o que diziam. E eu via Charles cada vez menos. Ou porque ele estava com ela, ou porque estava escrevendo alguma coisa para ela.
As coisas estavam ficando tão quietas, como um dia depois de uma queimada, cinzas voando, e aquela sensação de que não acabou pairando no ar, aquele arrepio na espinha de almas se desgrudando de seus corpos, flutuando por ai, por ali, aqui, ao nosso redor.
-Charles. – Murmurava quieta, calada, segurando nas mãos um papel sujo de batom. O dela. e o poema. O dele.

Não é minha morte o que
me preocupa, é minha mulher
abandonada com este
monte de
nada.

quero
no entanto
que ela saiba
que todas as noites
dormindo
ao seu lado

que mesmo as discussões
inúteis
sempre foram
esplêndidas

e que as palavras
difíceis
que sempre temi
dizer
podem agora ser
ditas:

Eu te
amo.


Ter deixado aquilo sobre a minha escrivaninha, pendendo da máquina de escrever que eu havia resgatado para ele, foi cruel. Senti  raiva. Senti vontade de rasgar o maldito papel, mas eu? Quem era eu? Só uma peça substituível do tabuleiro. Assim que eu me fosse para baixo da terra e levasse comigo os versos tristes e amargurados de uma vida toda, não haveria mais lembranças... Nem confissões. Talvez uma:

Eu te amo Charles.
Eu te amo mesmo que o mundo o chame de Hank.
Henry. Diabo a quatro.
Eu te amo e esse meu amor é desprezível.
Exagerado e complexo.
eu te amo e usaria letras maiúsculas,
Se essa minha confissão não fosse feita,
Entre sussurros inaudíveis”.



Charles eu te amo. E esse amor ainda vai me matar.